sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Cao Guimarães e o Som



Do artista mineiro Cao Guimarães, sobre o som:

"Da mesma forma que a imagem pode ser som, o som pode também ser imagem. Existem muitos pontos de confluência e fusão entre estes dois elementos. Imagem e som são farinha e ovo para a massa que vai ao forno. Para cada trabalho existe uma medida onde um mistério é fermentado. Tenho uma relação romântico-barroca com o som. Foi preciso encontrar O Grivo (e John Cage via O Grivo) e João Cabral de Melo Neto para que eles me ensinassem o outro lado da sonoridade. Aprendi a respeitar e ter carinho especial por cada partícula de som que nossos ouvidos alcançam (inclusive os que imaginamos). Aprendi a distinguir a gravidade da gravidez sonora, e expandir isso para as imagens. Se para Cage “o silêncio está grávido de som”, que tela estaria grávida de imagem, a branca ou a negra? Me pergunto se o silencio é branco ou negro. Se o silêncio está grávido de som ou se é um cemitério, um depositário de ossadas sonoras."

Copiado do http://www.sescsp.org.br/sesc/videobrasil/site/dossier019/entrevista.asp

3 comentários:

paoleb disse...

lembrei de uma afirmação do john cage por conta de sua obra 4'33, concerto para piano onde não se executa nota alguma e que é apontado como inspiração direta do 'zen for film' do nam june paik:
O silêncio não existe, pois sempre haverá os ruídos da sala de espetáculo, a respiração dos espectadores, as batidas do coração do músico.
por outra: se há ouvido, há som...

Vinícius Reis disse...

Paola, essa fala do John Cage é muito boa pro Imagens Habitáveis. Gostaria de citá-la no meu texto. Qual a referência?

paoleb disse...

querido, achei enfim, uma fonte segura sobre o john cage: está em "o som e o sentido", do josé miguel wisnik, um livro genial, se você ainda não tem adquira tb no natal.

Wisnik, José Miguel. O som e o sentido. São Paulo: Companhia das Letras: Círculo do Livro, 1989.

a primeira citação está na página 16:
"o som é presença e ausência, e está, por menos que isso apareça, permeado de silêncio. Há tantos ou mais silêncios quanto sons no som, e por isso se pode dizer, com John Cage, que nenhum som teme o silêncio que o extingue(1). Mas também, de maneira reversa, há sempre som dentro do silêncio: mesmo quando não ouvimos os barulhos do mundo, fechados numa cabine à prova de som, ouvimos o barulhismo do nosso próprio corpo produtor/ receptor de ruídos (refiro-me à experiência de John Cage, que se tornou a seu modo um marco na música contemporânea, e que diz que, isolados experimentalmente de todo ruído externo, escutamos no mínimo o som grave da nossa pulsação sangüínea e o agudo do nosso sistema nervoso)."

(1) cf. John Cage, De segunda a um ano (tradução de Rogerio Duprat) São Paulo, Huicitec, 1985, p. 98.

segunda passagem na pg 46-47:
"A famosa peça de John Cage, Tacet 4'33" (1952), junto com sua constatação do caráter ruidoso do silêncio, faz uma ponte com os lances de Satie. Um pianista em recital vai atacar a peça, mas fica com as mãos em suspenso sobre o teclado durante quatro minutos e trinta e três segundos; o público começa a se manifestar ruidosamente. Aqui também há um deslizamento da economia sonora do concerto, que sai de sua moldura, como uma máscara que deixa ver um vazio. A música, suspensa pelo intérprete, vira silêncio. O silêncio da platéia vira ruído. O ruído é o som: a música de um mundo em que a categoria da representação deixa de ser operante, para dar lugar a infinita repetição. Repetição do quê? Peças como essa não correspondem, evidentemente, à categoria usual de obra. Elas operam mais como uma marca, uma dobra sintomática e irrepetível, frisando enigmanticamente o campo da escuta possível, o campo daquele silêncio que pode ser ouvido por outro lado, "nas mutações fônicas imprevisíveis, oceânicas"...

ainda tem outras, mas paro por aqui.